segunda-feira, 1 de março de 2010

"Hymn For My Soul"



Para encerrarmos bem o dia, Joe Cocker, com cara de "empresário de mercado financeiro", com todo o gás aos 65 anos! O apresentador também vale ser observado, uma mistura de Cauby Peixoto com Eduardo Dusek.

O que você pode fazer por mim hoje?

Um depósito de 100 milhões de dólares já seria um bom começo!

Mas a pergunta vai mais fundo do que a epiderme de nossa tez consumista e de nossa mente proletária.

Num mundo com tanta pressa, com tanto trânsito, poluição, violência (física, moral, visual), o que podemos fazer pelo outro? Não vou aqui começar uma crônica como as de última página de revistas semanais, onde se altera pequenas estocadas com lições de moral, com vivências do autor pontuado por gracejos ocasionais para dar "leveza" ao tema. Nada disso! Serei duro, cortante e contundente. Mas colocarei algumas passagens pessoais e terá uma dose de humor, para não ficar pesado...

Quando pego meu carro, tenho prazer em dirigir. Prazer físico, quase tangível. Eu realmente gosto de dirigir. Parte desse prazer certamente decorre do fato de eu não "ter que dirigir", mas sim de eu o fazer quando quero, na hora que quero. No trânsito de São Paulo, parte desse prazer se esvai, pois além do asfaltamento irregular, com buracos tão grandes que tem seu próprio comércio e economia, valetas quem nem trator passa sem raspar o para-choques... Além disso, muitos dos demais motoristas são agressivos, barbeiros e em alguns casos, verdadeiras toupeiras (não eu, claro). Gente que, malandramente fica com seu carro na faixa (vazia) da esquerda para na última hora enfiar o bico na sua faixa bem em cima do cruzamento, para furar a fila que ele não pegou.

Também tem o oposto. Gente que fica, sozinha, na faixa da direita com viragem livre, mas pára no semáforo, porque quer mesmo é ir em frente, e com isso impede o fluxo que poderia - e deveria - estar livremente escoando à direita. Para essa gente, não ha buzina que baste. (já queimei duas).

Como vocês perceberam, sou tranquilo e pacífico, mas acabava adquirindo um comportamento hostil ao volante, mais ou menos como naquele desenho animado do Pateta. Mas a vida é uma caixinha de surpresas...

Eis que um dia eu estava na Avenida Brasil, acabando de cruzar a Avenida Rebouças vindo de Pinheiros, na faixa da esquerda (nesse trecho são mais de seis) quando um taxista, munido de um Chevrolet Meriva vem, desde a faixa da esquerda até a da extrema direita - a minha - cruzando a todos em velocidade incompatível com a situação, perfazendo uma linha reta como a que cruza as bandeiras de mergulho, terminando bem na minha frente. Eu, o Paladino da justiça, defensor da reforma agrária (não do MST), não permito! Lépido, aperto minha buzina como se fosse a trombeta do Apocalipse, avisando-o tronitroantemente que seu fim está próximo, e avanço. Ele freia subitamente, percebendo que seu reinado de arrojo estava acabado e buzina de volta (que audácia!), passo devagar ao lado dele e com as mãos faço o gesto de "passa por cima" com um semblante blasé.

Pronto! Foi a senha para que o espírito de Hagar, o terrível, possuísse o corpo do taxista que grudou na minha traseira e me seguia colado a poucos centímetros a cada mudança de faixa. Percebendo que a situação agora ganhara contornos pessoais, saí da avenida na primeira oportunidade virando à direita, com o taxi em meu encalço, que me ultrapassa e emparelha. Abre a janela e surge por detrás do volante a figura de um velhinho irado, vociferando palavras de ordem entre perdigotos, tosses e veias saltadas, chamando-me para o confronto físico.

Os gritos continuaram e ele bateu a mão no cinto, soltando-o. Eu também. Ele abriu a porta. Eu me inclinei para o lado, dando a entender que iria fazer o mesmo. Quando o homem já estava a uns 4 metros do meu carro, engatei primeira marcha e saí, não dando tempo a ele de retomar sua perseguição a mim, e tudo acabou bem.

Após alguns quarteirões de reflexão, e conferidas para ver se ele não voltara a frequentar meu retrovisor, que balde d´agua fria... Em minha cruzada pela justiça transital deixei o homem, um trabalhador, idoso, provavelmente com artrite, completamente transtornado. Ok, sei que parte da raiva dele não era por minha causa, eu fui o estopim de sentimentos represados durante dias de trânsito lento, chuvoso, abafado... Mas ainda assim me bateu uma tristeza. Por mais que eu estivesse certo (e estava), não queria deixá-lo à beira de um AVC, de um enfarte. Esse acontecimento me fez refletir.

Desde então, se alguém faz uma besteira ou esperteza no trânsito na minha presença, fico bravo sim, só que bem menos, pois sei que esses contratempos quando ignorados não mudarão em nada o curso de minha vida. Se eu me desgastar a toa a além de poder causar um enfarte em outro, posso levar um tiro de alguém menos cordato. É mais ou menos como aquela sua tia que reclama de tudo: Por mais que te canse, não vale a pena se desgastar por algo que você não pode mudar.

Por isso, antes de perguntar o que você pode fazer por mim hoje, te digo o que eu faço por você todos os dias: Deixo o trânsito mais gentil!

E você, o que pode fazer por mim hoje? Se não puder seguir a dica da primeira linha, pelo menos dê passagem, use o retrovisor, o pisca, a educação...